Massara Pieroni Advogados

STF: Bancos podem retomar imóveis sem intervenção do judiciário para execução do mútuo com alienação fiduciária em garantia

27/10/2023

Por Marcus Vinicius Couto de Oliveira e Ester Moura Benedetti

O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu na última quinta-feira (26/10/2023) o julgamento do Recurso Extraordinário nº. 860.631/SP, submetido à sistemática da repercussão geral (Tema 982), em que declarou ser constitucional o procedimento de execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia previsto na Lei nº. 9.514/1997.

A Lei nº. 9.514/1997 instituiu o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) e criou a figura alienação fiduciária como parte central desse modelo regulatório, instituto que permite que o devedor transferira temporariamente a propriedade fiduciária do imóvel ao credor como garantia de pagamento.

O artigo 26, caput e parágrafos, da Lei nº. 9.514/1997 estabeleceu o procedimento de execução extrajudicial do mútuo com alienação fiduciária em garantia. Com o inadimplemento de uma ou mais prestações do financiamento do imóvel, basta ao credor, o alienante fiduciário, formalizar a mora perante o Cartório de Registro de Imóveis, para que intime o devedor fiduciante para purgar a mora em 15 dias. Caso transcorra o prazo sem a quitação da dívida, o Cartório deverá proceder à consolidação da propriedade em nome do fiduciário na matrícula do imóvel, que fica autorizado a promover leilão público para alienação do bem. Não é necessária, portanto, a intervenção do judiciário para a retomada do imóvel.

Tal medida faz parte do conjunto de medidas previstas no marco regulatório criado pela Lei nº. 9.514/1997 que visavam fomentar o setor imobiliário, tornando-o mais atraente para investimentos, devido à rapidez na recuperação de créditos do que em comparação com a morosa execução judicial da garantia hipotecária, que desfavorecia o credor hipotecário.

Porém, o procedimento de execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia previsto na Lei nº. 9.514/1997 foi questionado judicialmente ao argumento de que seria inconstitucional, pois violaria viola os princípios do devido processo legal, da inafastabilidade da jurisdição, da ampla defesa e do contraditório, na medida em que permite ao credor fiduciário a excussão do patrimônio do devedor sem a participação do Poder Judiciário.

O Ministro Luiz Fux, Relator do Recurso Extraordinário nº 860.631/SP, leading case do Tema 982), conclui pela constitucionalidade do procedimento de execução extrajudicial previsto na Lei nº. 9.514/1997, por entender que não haveria violação aos princípios constitucionais suscitados, basicamente porque (i) é permitido que o devedor recorra ao Poder Judiciário caso entenda que seus direitos sejam violados, garantindo o acesso à jurisdição, (ii) o procedimento executório não é conduzido pelo credor, mas pelo o Ofício de Registro de Imóveis, que atua na condição de delegatário estatal, sendo observado rito que assegura a concretização do devido processo legal, ainda que em fase extrajudicial, (iii) além do que a própria noção conceitual da alienação fiduciária denotaria que a concretização da propriedade do bem pelo devedor fiduciante apenas ocorre com o total adimplemento da dívida, de modo que, até o cumprimento dessa condição, há mera expectativa do direito à propriedade, sendo-lhe, inclusive, permitido purgar a mora antes da consolidação da propriedade em nome do credor, evitando-lhe a perda do bem.

Ademais, o Ministro Relator destacou a importância do instituto da alienação fiduciária, com as garantias previstas em lei, como elemento da política regulatória que permite maior acesso ao financiamento imobiliário, a taxas de juros mais baixas, de modo que a supressão do procedimento de execução extrajudicial poderia significar desbalanceamento desse equilíbrio regulatório desenvolvido legislativamente.

O voto do relator foi acompanhado pela maioria dos demais Ministros do STF (8 votos a 3), tendo sido fixada a tese de que “É constitucional o procedimento da Lei nº 9.514/1997 para a execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia, haja vista sua compatibilidade com as garantias processuais previstas na Constituição Federal”.

Este entendimento do STF é vinculante para todo o Poder Judiciário, de forma que obrigatoriamente deverá ser aplicado em todos os processos judiciais em que se discute a questão.

A equipe do Massara Pieroni Advogados se coloca à disposição para prestar maiores esclarecimentos sobre a questão.

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